O tema da redação do Enem 2020 foi “O estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira”. Os participantes precisavam produzir um texto dissertativo-argumentativo de no máximo 30 linhas sobre essa temática, tendo como apoio os seguintes textos motivadores:
Mesmo sendo uma proposta esperada dentro do que o exame costuma cobrar, o tema gerou repercussão. Mas você sabe o que é de fato estigma e como esse conceito pode ser cobrado nas provas de vestibular e Enem?
Para esclarecer, a Revista Quero conversou com a professora de Sociologia do Poliedro, Letícia Netto.
Quais são os assuntos de Sociologia que mais caem no Enem?
O que é estigma social?
O estigma pode ser entendido como algo negativo que acontece em diversas situações da nossa vida e que afeta diretamente alguns grupos que não correspondem a um determinado padrão imposto pela sociedade. É algo que está oposto à individualidade, porque não considera as características individuais de cada pessoa, apenas generaliza comportamentos, desejos e modo de viver.
Para explicar as interações sociais, Goffman trabalha com a ideia de papéis sociais e faz uma comparação com o teatro. De acordo com o sociólogo, a sociedade se organiza e se relaciona por meio desses papéis, tendo como base aquilo que as pessoas esperam de nós.
Dessa forma, em diferentes situações, seja no trabalho ou nas relações familiares, cada indivíduo age como se fosse um personagem, ou seja, para cada situação haverá a representação de um papel social.
A professora Letícia ressalta que esses papéis sociais organizam a sociedade e que o conceito de estigma está ligado ao não cumprimento dessas expectativas. “Alguns papéis sociais que a gente desempenha não necessariamente tem a ver com nossa personalidade ou individualidade, mas sim com o funcionamento da sociedade. O estigma é a infração desses papéis ou o mal desempenho deles”, explica.
A consequência do estigma é a marginalização, a criminalização e a exclusão. Segundo a professora Letícia, o estigma destaca uma pessoa de forma pejorativa: “As pessoas estigmatizadas são pessoas excluídas e essa exclusão ocorre desde sempre, por serem vistas como quem está em desacordo com uma regra social ou por não corresponder a um padrão esperado”.
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Outsiders
Alguns sociólogos como Norbert Elias e John Scotson trabalham com a ideia de outsiders, que são grupos de pessoas excluídas socialmente por alguma característica que foge do padrão imposto em uma sociedade e por isso não conseguem se relacionar com outros grupos, ou seja, por um estigma.
Na obra “Os estabelecidos e os outsiders”, os sociólogos analisam alguns padrões de uma cidade inglesa. A exclusão do grupo de outsiders nada mais é do que a consequência da imposição de práticas culturais e da superioridade de um grupo dominante em uma sociedade.
Exemplos de estigma social
De acordo com a professora de Sociologia do Poliedro, Letícia Netto, todos os preconceitos podem estar relacionados ao estigma, porque é uma marca considerada anormal diante dos papéis sociais escolhidos pela sociedade.
A quebra de expectativa em agir de acordo com um padrão está diretamente ligada a diversos aspectos, como o corpo, o caráter e a orientação sexual. Confira alguns exemplos citados pela professora:
Pessoas com deficiência: são estigmatizadas quando a sociedade duvida da capacidade de realizarem diferentes atividades do cotidiano;
Grupos LGBTQIA+: fogem do padrão da família tradicional e de afetividade. Por isso sofrem perseguições, seus relacionamentos não são validados socialmente e são tidos como errados;
Presidiários: quando um presidiário sai da cadeia, ele tem dificuldade de se reinserir na sociedade pela falta de confiança das pessoas e por não acreditarem que possa haver uma mudança de caráter e comportamento. Então é comum que falte oportunidades de trabalho e que esse grupo seja marginalizado;
Xenofobia: os estrangeiros são estigmatizados por não terem suas culturas, crenças e valores respeitados. Dessa forma são excluídos dentro de uma sociedade diferente da de origem;
Preconceito contra idosos: os idosos são discriminados porque o envelhecimento está relacionado à fragilidade e incapacidade de desenvolver diversas atividades e conviver socialmente.
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Como o estigma social pode cair no Enem e em outros vestibulares?
Segundo a professora de Sociologia do Poliedro, Letícia Netto, o aluno tem que ter em mente que as questões de estigma estão relacionadas com grupos marginalizados, preconceitos e suas consequências.
Para ela, em provas como o Enem é mais difícil o estudante encontrar questões que cobrem diretamente o conceito de estigma. O comum de acontecer são questões relacionadas a preconceitos e outros problemas sociais, como foi o caso da redação da edição de 2020.
A professora alerta ainda para os tempos de pandemia e desastres ambientais que forçam a migração. Nesses casos, é muito comum que a xenofobia seja manifestada, porque milhares de pessoas saem de seus países e buscam asilo em outros para sobreviver.
Já em outras provas que cobram a Sociologia de forma mais detalhada, como a Universidade Federal de Uberlândia (UFU), a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e a Universidade de Pernambuco (UPE), os vestibulandos podem encontrar questões mais específicas.
O que a professora recomenda para essas duas situações é o contato com o sociólogo Zygmunt Bauman, além do Goffman que já foi citado anteriormente. Segundo ela, Bauman aborda principalmente a questão da xenofobia, gerada pela globalização.
De acordo com o sociólogo, a globalização une mercado, une as telecomunicações, mas divide pessoas. Apesar de toda essa união, os indivíduos não são vistos como bem-vindos e não tem a livre circulação em diversos países, porque a sua origem e suas características não são respeitadas.
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