Popularizados pelo filme “Piratas do Caribe, os piratas surgiram ainda na Antiguidade como bandidos dos mares que saqueavam embarcações e cidades costeiras. A pirataria ganhou força no período das Grandes Navegações, quando circulavam pelos oceanos navios lotados de riquezas e especiarias vindas das colônias.
Hoje, crimes de piratas ao estilo Capitão Jack Sparrow ainda acontecem, mas em proporção muito menor. Agora, um outro tipo de pirataria preocupa as autoridades do mundo todo: a pirataria moderna.
A pirataria moderna é definida como a reprodução, distribuição e venda de produtos e serviços sem a autorização dos proprietários e sem o pagamento dos direitos autorais. Sua prática é considerada crime e prevê reclusão de até quatro anos e multa.
Entre os itens mais pirateados, estão: roupas, calçados, eletrônicos, acessórios, perfumes, brinquedos, CDs e DVDs, cigarros, bebidas, medicamentos, livros, peças automobilísticas, instrumentos cirúrgicos, entre outros.
Por que a pirataria é normalizada no Brasil?
Apesar de ser um crime, a pirataria é uma atividade amplamente normalizada no Brasil. Nas ruas, é comum a figura dos vendedores ambulantes ou camelôs, barracas que vendem, principalmente, produtos de marca falsificados.
Já nas redes, o Brasil está entre os primeiros no ranking de países que mais acessam sites de pirataria. Por aqui, milhares de pessoas têm o hábito de baixar gratuitamente músicas, filmes e séries em sites e aplicativos de conteúdos pirateados.
Para a professora de Sociologia do cursinho Se Liga, Renata Esteves, as práticas da pirataria foram assimiladas pelos brasileiros e já fazem parte da cultura do país. Isso porque apesar dos altos índices de pobreza e a falta de acesso aos bens culturais influenciar no consumo de produtos falsificados, a pirataria é um hábito de pessoas de todas as classes sociais.
“Os hábitos do desvio e da corrupção são corroborados pelo famoso ‘jeitinho brasileiro’ tão presente em nosso comportamento. Trata-se das nossas condutas em busca de sobrevivência que envolvem a ‘malandragem’, a amoralidade e a corrupção. Sérgio Buarque de Holanda quando historiciza o brasileiro, o identifica como o ‘homem cordial’ que age a partir do coração e das emoções, possuindo uma forte propensão às informalidades”, justifica.
A professora Renata ainda elenca outros fatores que naturalizam a pirataria, como a ilusão de que é uma prática ilegal mais pacífica e a cultura do consumo que estimula o desejo por determinadas marcas.
Por que a pirataria é crime?
A pirataria é considerada crime de violação de direito autoral pelo Código Penal Brasileiro. Ao não pagar os direitos autorais, a prática da pirataria diminui os lucros do produto alvo da falsificação, causando danos às empresas legalizadas que pagam seus impostos em dia.
Além de afetar as empresas privadas, a pirataria prejudica diretamente a sociedade. Isso porque, no comércio de artigos pirateados, o governo federal deixa de recolher os tributos necessários, que seriam investidos nas áreas de saúde, educação, segurança pública e outras.
De acordo com o Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), em 2019, o Brasil perdeu R$ 291,4 bilhões para o mercado ilegal, somando os prejuízos de 15 setores industriais e a estimativa de impostos que deixaram de ser arrecadados.
No ramo da indústria de filmes e séries, segundo a Agência Nacional do Cinema (Ancine), a pirataria gera um prejuízo de R$ 4 bilhões e deixa de arrecadar R$ 2 bilhões em impostos. Só para as empresas de TV por assinatura, o prejuízo chega a R$ 9 bilhões por ano.
Se por um lado, os produtos falsificados se tornaram uma alternativa para a parcela da população sem poder aquisitivo para bancar os produtos originais, por outro, a pirataria contribui para o aumento do desemprego e da falta de investimentos nos serviços públicos, uma vez que prejudica a economia da indústria e do Estado.
O barato sai caro
Ao comprar um produto falsificado até 90% mais barato que o original, o consumidor acredita que sai em vantagem. Mas, na prática, ele está adquirindo um produto fora dos padrões de qualidade e sem nenhuma garantia.
Além de deixarem a desejar no quesito qualidade, durabilidade e eficiência, os produtos falsificados podem trazer riscos à saúde do consumidor. Por exemplo, óculos escuros sem proteção contra os raios ultravioletas, tênis sem a anatomia adequada, medicamentos sem eficácia, produtos com substâncias danosas e cancerígenas em sua composição, baterias com risco de explosão e muitos outros.
Foi o que aconteceu na série “Todo Mundo Odeia o Chris”. No episódio “Todo Mundo Odeia o Dia das Mães”, o protagonista Chris decide presentear sua mãe, Rochelle, com o caro perfume "Puro Vodoo". Sem conseguir comprar o perfume original, ele a presenteia com a versão falsificada, que causa uma alergia em Rochelle e muitos problemas para o jovem Chris.
Além disso, a pirataria está relacionada a uma rede de crimes, como tráfico de drogas, de armas, de pessoas, lavagem de dinheiro, corrupção e sonegação de impostos. Ou seja, ao consumir um artigo pirateado, o consumidor está financiando organizações criminosas e contribuindo para o aumento da violência.
Atualmente, se popularizaram as assinaturas de serviços de streaming, como a Netflix e o Spotify, que oferecem acesso a filmes, séries, músicas, podcasts e canais de forma legalizada por preços mais populares.
Combate à pirataria
Hoje, os esforços de fiscalização por parte do Estado se tornam insuficientes perto dos milhares de produtos falsificados em circulação. Na visão da professora Renata, é preciso que o Estado invista mais no combate à pirataria: “Há que se possibilitar frentes de combate e investigações policiais nos esquemas de ilegalidades, oferecer treinamento adequado e aumentar as fiscalizações nas fronteiras”.
Outras ações importantes são o aumento da rigorosidade da lei e a conscientização da população a respeito dos malefícios da pirataria. Para Renata, o governo também pode estimular o desenvolvimento do mercado formal, diminuindo o valor do tributo de alguns produtos e desencorajando o mercado ilegal.
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O que é a biopirataria?
Apesar do termo ainda ser pouco conhecido, a biopirataria nada mais é do que a prática da pirataria aplicada à natureza. Isto é, a exploração ilegal de recursos naturais e a apropriação dos conhecimentos sobre esses recursos para fins econômicos, sem nenhum tipo de autorização ou pagamento.
O primeiro registro de biopirataria no Brasil remete à chegada dos portugueses, no século XVI, quando houve a exploração intensa do Pau-Brasil, que quase causou a extinção da árvore.
Na prática da biopirataria, além de atividades como a exploração ilegal de recursos e o tráfico de animais, também existem os biopiratas que buscam se apropriar dos conhecimentos de povos tradicionais, como indígenas, camponeses, ribeirinhos e quilombolas.
Os biopiratas se destinam, principalmente, a países subdesenvolvidos da América do Sul, África e Sudeste Asiático, onde podem encontrar uma diversidade rica e pouca fiscalização. Disfarçados de cientistas ou turistas, eles podem coletar informações de povos nativos e traficar sementes, insetos, mudas, entre outros.
Um exemplo clássico de biopirataria no Brasil envolve o cupuaçu, fruto tradicional da região norte do país. Uma empresa japonesa patenteou um chocolate feito do caroço da fruta, impedindo sua comercialização utilizando o nome cupuaçu sem o pagamento de direitos autorais. Em 2004, a patente foi quebrada após esforços conjuntos do governo brasileiro e organizações não-governamentais (ONGs).
Quais as consequências da biopirataria?
A biopirataria traz inúmeros prejuízos ao Brasil, tanto econômicos quanto ambientais. Em relação à biodiversidade, a exploração e o tráfico em massa de recursos e animais podem levar à extinção de inúmeras espécies.
Também há o impacto ambiental pela introdução de espécies exóticas, ou seja, que não pertencem à biodiversidade brasileira e podem causar desequilíbrios. É o caso da abelha africana, uma espécie de abelha mais agressiva. Trazidas para o Brasil em 1956 por um cientista, algumas abelhas africanas fugiram e hoje estão por todo o continente.
Outro problema da biodiversidade é a divisão injusta dos lucros gerados pela comercialização de recursos típicos do Brasil ou de conhecimentos de povos tradicionais. Assim, uma planta com potencial medicinal descoberta pelos indígenas, por exemplo, pode ser apropriada e gerar lucros às grandes empresas estrangeiras, ao invés de beneficiar as comunidades tradicionais e o governo brasileiro.
Além disso, quando um recurso brasileiro é patenteado por uma empresa estrangeira, os cientistas e a indústria do Brasil perdem o direito de pesquisar e comercializar um recurso típico do país.
Para a professora de Biologia Fernanda Vernier, do Anglo Chácara Santo Antônio, o melhor jeito de remediar a questão da pirataria hoje seria “um maciço investimento em pesquisa para que a gente possa se apropriar desses conhecimentos e dos benefícios da biodiversidade que é nossa”.
Entre outras ações para o combate à biopirataria, estão o aumento da fiscalização nas fronteiras do país, maiores penalidades aos biopiratas e a conscientização sobre o tema com povos indígenas, ribeirinhos, entre outros.
Pode cair na Redação do Enem?
A resposta é sim! Tanto o tema pirataria quanto a biopirataria podem ser tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Para Isabela Arraes, professora de Redação no Cursinho Se Liga, as temáticas abordam dois problemas frequentes e muito pertinentes nos dias atuais.
Numa redação com o tema pirataria, a dica da professora Isabela é enfatizar a ideia de que essa prática desrespeita os direitos autorais, menosprezando e colocando em xeque os direitos dos artistas.
“Então, o governo deve agir para evitar esses problemas, defendendo os produtores de conteúdos culturais por meio de leis de incentivo às criações artísticas. Assim, o Poder Legislativo deve buscar resguardar direitos àqueles que se propõem a disseminar conhecimentos de interesse popular”, propõe.
No caso da biopirataria, as propostas de intervenção sugeridas pela professora são o incentivo a criação de leis mais incisivas por parte do Poder Legislativo e a criação de projetos que visem à solução do problema por ONGs.
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